Choveu a cântaros depois do meio-dia. Ficamos vinte minutos em uma esquina, esperando acalmar, olhando com desalento a gente que corria. Mas estávamos nos resfriando a olhos vistos, e eu comecei a espirrar com uma regularidade ameaçadora. Conseguir um táxi era algo impossível. Estávamos a duas quadras do apartamento e decidimos ir a pé. Na realidade, corremos também como loucos e chegamos ao apartamento em três minutos, encharcados. Fiquei por um momento morto de cansaço, estirado como um objeto inútil sobre a cama. Apesar disso, ainda tive forças para buscar uma colcha e envolvê-la. Ela havia tirado o casaco, que estava pingando, e também a saia, que ficara em um estado lastimável. Aos poucos fui me acalmando e meia hora depois já me sentia aquecido. Fui à cozinha, acendi o fogareiro, pus a água para esquentar. Do quarto, ela me chamou. Ela havia se levantado, assim, envolta na colcha, e estava junto à janela, olhando a chuva. Aproximei-me, também olhei como chovia, por instante não dissemos nada. De repente, tive consciência de que esse momento, de que esse pedaço de cotidianidade, era o grau máximo do bem-estar, era a Felicidade.
Martín Santomé, num dia de chuva de um sábado 6 de julho, em um instante de plenitude.
("A Trégua" de Mario Benedetti)