"Sabe que você é responsável por uma das crises mais
importantes da minha vida?" Perguntou: "Econômica?" e ainda ria.
Respondi: "Não, sentimental" e ficou séria. "Nossa", ela
disse, e esperou que eu continuasse. E continuei: "Veja, Avellaneda, é
muito provável que o que eu vou lhe dizer pareça uma loucura. Se for assim, me
diga logo. Mas não quero mais fazer rodeios: acho que estou apaixonado por
você." Ela esperou alguns instantes. Nenhuma palavra. Olhava fixamente
para a bolsa. Creio que ficou um pouco ruborizada. Não tentei identificar se o
rubor era porque estava radiante ou envergonhada. (...)
Por fim não pude mais esperar e disse: "E?" Sorri de modo um pouco forçado e acrescentei com uma voz trêmula, que desmentia o tom brincalhão que pretendia o conteúdo: "Tem algo a declarar?" Deixou de olhar para sua bolsa. Quando levantou os olhos, pressenti que o pior momento já tinha passado. "Eu já sabia", ela disse."
Martín Santomé e Laura Avellaneda, perdendo-se entre dúvidas e certezas. (em "A Trégua" de Mario Benedetti)